De acordo com o linguista suíço Ferdinand de Saussure, o “ponto de vista cria o objeto”. De fato, em relação à língua, por exemplo, existem muitas maneiras de abordá-la. Os gramáticos analisam sua estrutura canônica, ortodoxa, ou seja, a língua padrão e suas inúmeras regras; já os linguistas estudam a língua em movimento, suas variações ao longo do tempo e as influências recebidas, que não são poucas. Partindo deste último olhar, trazemos uma reflexão sobre novos vocábulos que vêm sendo incorporados à fala de muitas pessoas. Já parou para prestar atenção?
Bem, “domingou mais fresco hoje”. Em meu notebook, a palavra “domingou” ficou sublinhada em vermelho, indicando desvio da grafia – para o gramático, o é; para o linguista representa um jeito novo de se dizer que o domingo chegou! Pois bem, já discutimos sobre o internetês e os estrangeirismos, cada vez mais presentes em nossa língua, bem como sobre os motivos que os levam a estar imbricados nela. E o “sextar”, como compreender?
No dicionário impresso Aurélio de 2012, a palavra não existe. Assim, mais uma vez, estamos diante de uma variação da língua com influências do mundo contemporâneo, das mídias digitais e, sem dúvida, da criatividade do brasileiro: a partir do substantivo “sexta-feira”, referente a um dos dias da semana, criou-se um verbo, “sextar”, com todas as conjugações de um verbo pessoal, embora seja mais usado como impessoal, como em “Sextou rapidinho esta semana!” (e isso vale também para os demais dias da semana).
Em artigo da Revista Scielo, a pesquisadora Vera Costa (2015) afirma que “a variação linguística, portanto, é inerente a toda e qualquer língua viva do mundo. Isso significa que as línguas variam no tempo, nos espaços geográfico e social e também de acordo com a situação em que o falante se encontra”. Posto isso, fica claro que a língua evoca falantes para que seja viva e para que ambos mantenham uma relação de interdependência; nesse processo, ela também passa a ser construída por ideologias.
Nessa linha de pensamento, “sextou” foi o dia da semana que mais “bombou”, seguido de “sabadou” e “domingou”. Subentendemos que, após uma semana de árduo trabalho, chegar à sexta é motivo de comemoração, uma vez que muitos não trabalham aos finais de semana e poderão usufruir de descanso, possibilitando, portanto, ter uma noite de sexta-feira mais prolongada. Dizer “sextou”, portanto, é marcar que se teve vitória até o momento, porque se “sobreviveu” e pode comemorar.
O filósofo Confúcio já dizia que “quem não conhece o valor das palavras não saberá conhecer os homens”, ou seja, as palavras dizem muito de nós. Ah, e em relação a novos vocábulos, quem for atravessar o estado de São Paulo pela ponte rodoferroviária irá encontrar, do lado de lá, já em Mato Grosso do Sul, um posto de pedágio e poderá dizer que está “pedagiando” ao passar pelas catracas e pagar (é claro) - boa viagem!
Profa. Ma. Alessandra Manoel Porto – alessandra.porto@fatec.sp.gov.br
Docente da Fatec Jales – fatecnologia@fatecjales.edu.br